sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Hierarquia japonesa


                    É quase impossível conviver com isso, mas temos de nos acostumar e não nos indignar com coisas que talvez jamais venham a mudar, porém a esperança é a última que morre. Toda vez que paro o carro na famosa placa tomarê, reflito sobre a questão da qual falarei agora.

                    É comum, e todo brasileiro que vive no Japão sabe disso, parar o carro para entrar numa avenida e os motoristas não pararem para você entrar. Até aí tudo bem, mas o incrível é quando o trânsito pára e, ao invés de deixarem aquele espaço de um veículo permitindo a sua entrada, vão adiante ocupando esta vaga, e se só isso já não me causasse indignação, pior é o próximo carro que pára logo atrás deste ficando bem na sua frente. A coisa não acaba por aí. Como num extremo da ignorância, não sei se a minha por não conseguir compreender ou pela deles, é quando o trânsito começa a andar e o auto que está logo atrás do carro que parou na sua frente parte grudado nele impedindo mais uma vez a sua entrada e assim todos vão adiante e você continua parado ali até que todos passem e você consiga entrar na avenida apenas quando já não vierem mais carros.

                    Pensei muito sobre isso e cheguei a conclusão de que isto se deve à maneira do japonês pensar. Neste país onde a hierarquia é a idéia suprema e imutável, reflete-se em todos os atos e em cada detalhe na terra do sol nascente. No caso do trânsito, eles nada mais pensam que - eu estou à frente - traduzindo este ato nesta forma hierárquica de pensar. Talvez nem mesmo eles saibam porque agem assim. É uma coisa que passa de geração em geração desde a era dos shoguns.

                    Num grupo de empresários sentados à mesa, ninguém se serve até que a figura mais importante toque a comida ou faça aquele gesto levantando o braço significando sirva-se.

                    Tudo bem que a educação oriental é exemplo para todo o resto do planeta, mas acho que esse sentimento atinge tão profundamente o cidadão que ultrapassa limites de lógica e até bom senso.

                    Um exemplo típico são os caixas das lojas de conveniência ou qualquer outro estabelecimento comercial. Mesmo parecendo óbvio, quando dispomos apenas duas notas iguais ao pagar uma mercadoria, o funcionário confere o dinheiro duas vezes. Enfia as notas entre os dedos, conta, as inverte e conta novamente. Isso ocorre porque lhe foi dito que é para ser feito desta maneira e mesmo que visivelmente esteja óbvio ele tem que fazer o que foi ordenado e não o que ele pensa!

                    Isto implica fundamentalmente na questão da criatividade japonesa. Você tem que fazer o que mandam e não o que pensa. Criar, apenas com o consentimento, aprovação e opinião do superior, onde a criação já não será mais sua.